terça-feira, 27 de maio de 2008

Rosa e Azul

Na minha mais longínqua infância, morei em um minúsculo lugarejo chamado Estreito, um distrito da cidade de Pedregulho no interior de São Paulo. Lá moravam apenas os funcionários da estatal Furnas Centrais Elétricas que trabalhavam na usina construída ali no fim dos anos 1960. Para ser exato, construída no estreito do Rio Grande.

Essa pequena vila tinha uma estrutura bem pequena, mas suficiente para comportar os funcionários da usina e suas famílias. O lugar se resumia a uma centena de casas, um clube, um hotel, um cinema, um açougue, um mercado, um ambulatório, uma igreja, um aeroporto, um banco, uma butique. Vendia-se o básico. Se você quisesse coisas mais complexas tinha de viajar a Franca, a mais ou menos 70 quilômetros.

Pelos meus cálculos, morei nesse lugar dos 0 aos 4 anos. Lá estão as minhas lembranças mais antigas e, por essa razão, muito preciosas. Nunca converso muito com meus pais sobre esse período, por isso imagino que grande parte do que me lembro tenha saído de minhas memórias mesmo.

A casa, salvo engano, tinha três quartos (sendo um de empregada), sala, dois banheiros (um de empregada), cozinha, copa conjugada a uma área de serviço, onde ficavam o tanque de lavar roupas, uma mesa onde fazíamos nossas refeições e a máquina de costuras da minha mãe. Lembro-me também de um pequeno forninho elétrico com uma resistência incandescente, de uma mesa na cozinha. A sala tinha, se é que me lembro, uma reprodução do quadro As Meninas Cahen d’Anvers de Renoir. Havia ainda uma estante de livros (com poucos livros), um sofá e uma poltrona de couro marrom e uma tevê preto-e-branco de 16 polegadas onde eu assistia à Pantera Cor-de-Rosa e Viagem ao Fundo do Mar. Os quartos tinham cortinas com forro. O chão da cozinha era de ladrilhos vermelhos e pequenos, enquanto o da sala e dos quartos era de tacos de uma cor bem escura.

Do lado direito da casa havia uma grande árvore onde meu pai dependurara um balanço. Eu que naqueles tempos pensava que os meus tios e meu avô – que eram mecânicos de automóveis – fossem uma espécie de professor Pardal (Gyro Gearloose), sonhava com alguma engenhoca que pudesse me fazer balançar sem que existisse alguém me empurrando.

A maior conquista daquele período foi aprender a falar. Comecei com menos de um ano e não parei mais. Era a verdadeira matraca, falava com tudo e com todos (o tempo inteiro): no supermercado, no ônibus em casa. Não sei como meus pais me suportavam. Fora isso, eu gostava de utilizar intermináveis "porquês" para tudo e qualquer coisa.
Não sei como depois de ter dado à luz uma maritaca fujona, indomável e intratável como eu (eu era quase um Fox Terrier), meus pais ainda resolveram ter mais filhos. Felizmente, para mim inclusive, eles tiveram muito mais sorte com os outros dois.

Você já deve ter ouvido falar da loucura que foram os anos 70. Pois é, eu me lembro basicamente de ter tido duas amiguinhas: Claudinha e Denise. Irmãs, eu acho. Se bem que tenho impressão de que Claudinha era morena e Denise, loura. Vivíamos juntos os três, nadávamos sem roupas, tomávamos banho juntos e não queríamos nem saber de trabalho. Eu era mais ligado à Claudinha. Ela foi a primeira amizade com uma pessoa fora de minha família. Lembro-me de que ela morava na casa da esquina no quarteirão em frente ao de minha casa. Saindo de casa, virando a esquerda podia-se ver o quintal da casa dela. Havia um terreno bem amplo junto ao quintal.

É muito triste que se escapem os momentos exatos que passamos juntos e mesmo os seus traços já me escaparam. Lembro-me apenas de ela ser morena, ter cabelos cacheados. Nosso relacionamento não era lá muito paz e amor. Ao contrário, era repleto de brigas. Mas eu era bem mais esperto do que hoje; minha arma contra a opressão da mulher era a mordida. Brigávamos pelos motivos mais absurdos e mais irrelevantes, brigas feias. Nunca houve reconciliação, até porque tudo já era previamente perdoado. Eu imagino que não havia nada que pudéssemos fazer um ao outro que abalasse a nossa amizade. Éramos companheiros de absolutamente tudo, brincadeiras, traquinagens e fugas - esse o meu passatempo predileto.

Das várias coisas que eu me lembro de Claudinha, ficou um único detalhe que descobri apenas há alguns anos, numa das poucas vezes que falei com aminha mãe sobre ela. Aliás, quem se lembrava desse detalhe era ela, porque eu jamais o havia percebido. O que é quase inconcebível, já que eu era uma radiola destemperada e ela, uma pessoa tão próxima com quem eu tinha contato diário. Desse modo, foi um choque quando minha mãe me disse que Claudinha era muda.

Um comentário:

haleimajaimille disse...

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