terça-feira, 8 de abril de 2008

O milagre do vinho

Sei que é muito pedante, mas vou começar citando Voltaire. Voltaire discorreu páginas e páginas a cerca dos milagres atribuídos a divindades. Eu por acaso li pouquíssimas. Li basicamente um texto que sintetizava a coisa toda e dava uma idéia básica do que ele quis dizer quando torcia o nariz para milagres.

Ele contestava a importância do milagre como uma afirmação da fé em um Deus perfeito e onipotente (como alguns que existem ou não). Se Deus era perfeito, sua obra também deveria ser. Mesmo no que consideramos imperfeito, haveria ali um equilíbrio que tornaria o conjunto perfeito. Aí então o milagre seria uma intervenção de Deus na sua obra já perfeita. Ou seja, seria um reparo ali e outro aqui para arrumar algo que já é perfeito... ou não? Ou então há-de se questionar sobre a verdadeira perfeição da obra.

Deixe-me ser mais claro, ok? Suponhamos um relojoeiro perfeito, o relógio produzido por ele deveria ser perfeito. Se esse relógio precisasse de reparos o tempo todo, então onde estaria a perfeição.

Eu não sei se alguém já refutou isso. É bem, provável que sim, aliás, é deve até ser bem simples.
Bastaria dizer que a perfeição também é a necessidade de consertar as coisas para que a presença divina seja sentida. É um exemplo... ok. Bem ruim. Mas isso, além de não vir ao caso, é só para ilustrar o que eu quero dizer.

Eu sempre fiquei intrigado com essas religiões que fazem do milagre uma moeda de troca. Ou seja, eu me comunico telepaticamente com um Deus, peço a ele um emprego, um carro novo um favor pessoal qualquer em troca de bajulação eterna. O camarada por vezes recorre a esse contato telepático que tem com o soberano só para lembrar-Lhe que Ele é o maioral, o bonzão e coisa e tal. Sempre me intrigou a troca de favores pessoais por bajulação, seja com seu chefe, seu tio ou seu Deus.

Wittgenstein tinha, a meu ver, uma atitude exemplar, filho de um judeu convertido ao protestantismo e de uma judia convertida ao catolicismo, sua conduta religiosa era digna de nota. Quando lutou na primeira guerra, alistou-se no exército do império austro-húngaro e pediu para ser colocado na linha de frente. Em suas cartas as suas irmãs e colegas de Cambridge, Wittgenstein fala de balas que passavam voando sobre sua cabeça. Ele nunca rezou pedindo que seu Deus desviasse as balas de sua cabeça, mas sempre orou por coragem e iluminação.Wittgenstein acabou saindo vivo do conflito e foi durante esse período que escreveu o Tractatus Logico-Philosophicus.

Eu por exemplo só tive uma experiência milagrosa na vida. E se por isso tivesse de ser devoto de alguma deidade, essa seria Dionísio. Meu milagre, em geral vem engarrafado e dependendo do quanto você quer empenhar é maior ou menor, tinto ou branco, francês, italiano, espanhol, português, australiano, californiano, chileno e até (olha só!) argentino.

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