Outro dia, um sujeito filósofo veio à empresa em que eu trabalho e produziu um falso equivoco similar a este. Ele narrava um acontecimento em que havia ido a uma empresa fazer uma palestra e tivera um contratempo com a recepcionista. O episódio, segundo suas palavras, foi mais ou menos assim (estou parafraseando):
- Bom dia, eu vim falar com o presidente da empresa.
- Qual o seu nome por gentileza?
- Professor Fulano de Tal
- De onde?
- De onde vim? – perguntou o filósofo – Não sei nem se vim de algum lugar.
- De onde o senhor é.
- No momento a única coisa que posso afirmar é que sou do lado de cá do balcão.
Em seguida ele narrou como a recepcionista chamou o segurança e como ele no fim triunfou, quando presidente do banco chamou a atenção da recepcionista, blá, blá, blá.
O professor (filósofo) Fulano de Tal transformou o jargão comum empregado por uma recepcionista em uma questão filosófica.
Transformar questões triviais em questões filosóficas não é um processo complicado. Aliás, é bem simples. Principalmente, quando estão envolvidas palavras como "onde", "quando", "pensamento", "tudo" "bem" etc. Desse modo a pergunta "De onde você vem" pode na cabeça de um mau filósofo se tornar uma questão absolutamente sem resposta. Ainda mais diante de um filósofo virtuose como este camarada.
Para a recepcionista, o segurança, o presidente do banco e para mim, inclusive, a pergunta é absolutamente pertinente. Isso porque envolve questões cotidianas normalmente aceitas de comum acordo. Pertencentes ao senso comum.
O que o filósofo da nossa história fez foi subtrair o sentido do senso comum e dar a ele uma nova roupagem. Mostrando que o senso comum está errado em considerar a questão “De onde o sr. Vem” como uma questão trivial. Porque, para esse sujeito obviamente, essa questão só pode ser respondida mediante um longa reflexão.
Problemas como esse são problemas fabricados. Trata-se de um mal-entendido provocados à revelia da lógica. Deixe-me dar um exemplo. Uma pessoa se dirige a um gramático e lhe pergunta: "Quantas horas". A mensagem é obviamente compreendida e pode ser perfeitamente respondida. Contudo um dos interlocutores, o gramático, considera que a pergunta não tem validade por não respeitar o padrão normativo da língua. Desse modo, o gramático se comporta como se não tivesse entendido a pergunta, criando uma falsa incompreensão de uma sentença corriqueira. O seu objetivo é dizer ao seu interlocutor (ou puni-lo com a incompreensão) pelo uso incorreto das normas e padrões da língua.
O problema com o gramático é simples de ser resolvido, já que a gramática da língua é – em quase todos os aspectos – definida. Então, basta seguir à risca as normas e regras gramaticais que a comunicação é perfeitamente possível. Um gramático jamais questionaria a construção da frase "De onde você vem?". Porque do único ponto de vista que poderia interessar ao gramático ela está correta.
Já o mau filósofo vê na questão um enigma cósmico. Por que? Simplesmente porque ele trapaceia com a linguagem. De posse de sua autoridade, ele a tira do senso comum e a torna propriedade de seus iguais. Já que não se conhecem regras definidas nesse caso, o mal entendido se perpetua com figuras como essa.
2 comentários:
Esta história está muito mal contada, o que o presidente de uma empresa poderia querer com um filósofo?? Afinal de contas, tirando os pré-vestibulados, para quem mais os filósofos são úteis?? A recepcionista realmente agiu errado ela deveria ter acabado logo com a conversa, tipo
Prof. Fulano: "Eu sou o filósofo, vim falar com o presidente da empresa."
Recepcionista: "Para que?"
Prof. Fulano: "..."
Se fosse o Parmênides, quem sabe?
- Eu sou o Parmênides e vim aqui para falar com o presidente da empresa.
- Par´o que?
- Parmênides.
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